A poesia tem o poder de nos emocionar, de nos transportar para outros mundos e de nos educar acerca da complexidade humana.
Por todos esses motivos, e muitos mais, o contato das crianças com a poesia pode ser mágico e potenciar um amor pela leitura que durará a vida toda.
Está procurando poemas curtos para ler com as crianças e inspirar os pequenos leitores? Confira as composições que selecionamos, e comentamos, para você.
1. Ou isto ou aquilo, de Cecília Meireles
Ou se tem chuva e não se tem sol
ou se tem sol e não se tem chuva!
Ou se calça a luva e não se põe o anel,
ou se põe o anel e não se calça a luva!
Quem sobe nos ares não fica no chão,
quem fica no chão não sobe nos ares.
É uma grande pena que não se possa
estar ao mesmo tempo em dois lugares!
Ou guardo o dinheiro e não compro o doce,
ou compro o doce e gasto o dinheiro.
Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo…
e vivo escolhendo o dia inteiro!
Não sei se brinco, não sei se estudo,
se saio correndo ou fico tranquilo.
Mas não consegui entender ainda
qual é melhor: se é isto ou aquilo.
Cecília Meireles (1901 – 1964) foi uma notória escritora, artista e educadora brasileira. Considerada uma das maiores poetas nacionais, a autora também se destacou no campo da literatura infantojuvenil.
Alguns dos seus poemas dedicados ao público infantil se tornaram verdadeiros clássicos e continuam sendo muito populares entre leitores de todas as idades.
O poema em análise, publicado na obra homônima Ou Isto ou Aquilo (1964) é, talvez, o mais famoso. A composição contém um ensinamento fundamental acerca do modo como a vida funciona: temos, constantemente, que fazer escolhas.
Isso implica, no entanto, que não podemos ter tudo ao mesmo tempo. Quando optamos por uma coisa, estamos abrindo mão de outra. A poetisa consegue traduzir esse eterno sentimento de incompletude através de exemplos simples, com elementos do cotidiano.
Conheça mais sobre a poesia de Cecília Meireles.
2. Pessoas são Diferentes, de Ruth Rocha
São duas crianças lindas
Mas são muito diferentes!
Uma é toda desdentada,
A outra é cheia de dentes…
Uma anda descabelada,
A outra é cheia de pentes!
Uma delas usa óculos,
E a outra só usa lentes.
Uma gosta de gelados,
A outra gosta de quentes.
Uma tem cabelos longos,
A outra corta eles rentes.
Não queira que sejam iguais,
Aliás, nem mesmo tentes!
São duas crianças lindas,
Mas são muito diferentes!
Ruth Rocha (1931) é uma das maiores escritoras de livros infantis do panorama nacional. Sua composição mais popular é, sem dúvida, O Direito das Crianças, onde a autora enumera as condições para uma infância saudável e feliz.
Neste artigo, contudo, escolhemos analisar o poema Pessoas são Diferentes, pela sua forte mensagem social. Aqui, a autora ensina o leitor a compreender e a aceitar a diferença.
No poema, há a comparação de duas crianças e a conclusão de que contrastam tanto na sua imagem, como nos seus gostos. O sujeito poético deixa evidente que uma não é superior à outra: não existe um jeito certo de ser.
Num mundo que ainda é regido por padrões limitados de beleza e comportamento, Ruth Rocha lembra as crianças (e os adultos) que o ser humano é múltiplo e que todas as pessoas merecem o mesmo respeito.
3. O Pato, de Vinícius de Moraes
Lá vem o pato
Pata aqui, pata acolá
Lá vem o pato
Para ver o que é que há.
O pato pateta
Pintou o caneco
Surrou a galinha
Bateu no marreco
Pulou do poleiro
No pé do cavalo
Levou um coice
Criou um galo
Comeu um pedaço
De jenipapo
Ficou engasgado
Com dor no papo
Caiu no poço
Quebrou a tigela
Tantas fez o moço
Que foi pra panela.
Amado pelos adultos, Vinicius de Moraes (1913 — 1980) também foi um poeta e músico muito popular entre as crianças. O Pato faz parte das composições infantis do "poetinha" que foram publicadas na obra A Arca de Noé (1970).
Os poemas, focados sobretudo em animais, foram escritos para os filhos do artista, Suzana e Pedro. Anos mais tarde, em parceria com Toquinho, Vinicius lançou adaptações musicais desses versos.
O Pato é um poema divertido de ler com as crianças, por causa do seu ritmo e das suas aliterações (repetições de consoantes). Os versos contam a história de um pato que estava fazendo um monte de travessuras.
Vamos assistindo, gradualmente, às consequências do seu mau comportamento. Por conta de suas más ações, o pobre pato morre e acaba na panela.
Conheça mais sobre a poesia de Vinicius de Moraes.
4. O Cuco, de Marina Colasanti
Mais esperto que maluco
este é o retrato do cuco.
Taí um que não se mata
pra fazer um pé-de-meia
e nem pensa em bater asa
pra construir a casa.
Para ele o bom negócio
é morar em casa alheia,
e do abuso nem se toca.
Os seus ovos, rapidinho,
põe no ninho do vizinho
depois vai curtir um ócio
enquanto a vizinha choca
Marina Colasanti (1937) é uma escritora e jornalista ítalo-brasileira, autora de várias obras populares de literatura infantil e infantojuvenil.
O Cuco faz parte da obra Cada bicho seu capricho (1992), na qual Colasanti mistura o amor pela poesia com o amor pelos animais. Assim, os seus versos observam e descrevem as singularidades de cada bicho, educando o leitor mirim.
O poema em análise se foca no comportamento do cuco, bem diferente da conduta das outras aves. Em vez de construir o próprio ninho, o cuco é famoso por deixar os seus ovos em ninhos alheios.
Assim, os ovos dos cucos acabam sendo chocados por pássaros de outras espécies. Esse fato faz com o animal seja encarado, na nossa cultura, como sinônimo de esperteza e independência.
5. Mãe, de Sérgio Capparelli
De patins, de bicicleta
de carro, moto, avião
nas asas da borboleta
e nos olhos do gavião
de barco, de velocípedes
a cavalo num trovão
nas cores do arco-íris
no rugido de um leão
na graça de um golfinho
e no germinar do grão
teu nome eu trago, mãe,
na palma da minha mão.
Sérgio Capparelli (1947) é um jornalista, professor e escritor brasileiro de literatura infantojuvenil que venceu o Prêmio Jabuti nos anos de 1982 e 1983.
O poeta escreveu várias composições sobre a figura materna e sua ligação intemporal com os filhos. Em Mãe, temos uma declaração de amor do sujeito à progenitora.
Enumerando todas as coisas que vê, ilustra que as memórias e os ensinamentos da mãe estão presentes em cada elemento da realidade, cada gesto do cotidiano.
Deste modo, as palavras doces de Capparelli traduzem um sentimento maior que a própria vida e um laço inquebrável entre mães e filhos.
6. Pontinho de vista, de Pedro Bandeira
Eu sou pequeno, me dizem,
e eu fico muito zangado.
Tenho de olhar todo mundo
com o queixo levantado.
Mas, se formiga falasse
e me visse lá do chão,
ia dizer, com certeza:
- Minha nossa, que grandão!
Pedro Bandeira (1942) é um escritor brasileiro de obras infantojuvenis que venceu o Prêmio Jabuti em 1986. Este é um dos poemas do livro Por enquanto eu sou pequeno, lançado em 2002. O sujeito parece ser uma criança que está transmitindo o seu "pontinho de vista" sobre a vida.
Ele afirma que é visto como pequeno pelos demais e precisa erguer a cabeça para falar com os outros. No entanto, ele sabe que os conceitos não são absolutos e dependem da forma como encaramos as coisas.
Por exemplo, na perspectiva de uma formiga, o eu-lírico é enorme, um verdadeiro gigante. Deste modo, e através de um exemplo acessível para as crianças, Pedro Bandeira dá uma importante lição de subjetividade.
7. Porquinho-da-Índia, de Manuel Bandeira
Quando eu tinha seis anos
Ganhei um porquinho-da-índia.
Que dor de coração me dava
Porque o bichinho só queria estar debaixo do fogão!
Levava ele pra sala
Pra os lugares mais bonitos mais limpinhos
Ele não gostava:
Queria era estar debaixo do fogão.
Não fazia caso nenhum das minhas ternurinhas...
— O meu porquinho-da-índia foi a minha primeira namorada.
Manuel Bandeira (1886 — 1968) foi uma das mais importantes vozes do modernismo brasileiro. Sua poesia de linguagem simples e direta cativou, e continua cativando, leitores de várias gerações.
Porquinho-da-Índia é uma das suas composições adequadas para o público infantil. Lembrando os tempos da infância, o sujeito poético reflete sobre o seu antigo porquinho-da-índia e a relação difícil que mantinha com o animal.
Apesar de oferecer todo o carinho e conforto ao bichinho, ele "só queria estar debaixo do fogão". Nos versos, o eu-lírico fala sobre a primeira vez que sentiu a rejeição, memória que guardou para o resto da vida.
Por vezes o nosso amor não é correspondido com a mesma intensidade. Mesmo num tom melancólico, o sujeito encara o fato com leveza e sabe que ele faz parte da vida.
Conheça mais sobre a poesia de Manuel Bandeira.
8. Menina passarinho, de Ferreira Gullar
Menina passarinho,
que tão de mansinho
me pousas na mão
Donde é que vens?
De alguma floresta?
De alguma canção?
Ah, tu és a festa
de que precisava
este coração!
Sei que já me deixas
e é quase certo
que não voltas, não.
Mas fica a alegria
de que houve um dia
em que um passarinho
me pousou na mão.
Ferreira Gullar (1930 – 2016) foi um poeta, escritor, crítico e ensaísta brasileiro, sendo também um dos fundadores do neoconcretismo.
Em Menina Passarinho, o sujeito se dirige a alguém cujos gestos são leves e delicados. Assim, ele compara a garota a um passarinho, que passa voando e pousa na sua mão.
Esse breve encontro é capaz de alegrar o sujeito, provocando uma festa no seu coração. Mesmo ciente de que esse momento é efêmero, e que provavelmente não voltará a ver a Menina Passarinho, consegue apreciar a sua recordação.
A composição vem lembrar os leitores que as coisas não precisam durar eternamente para serem especiais. Por vezes, os momentos fugazes podem ser os mais belos e também os mais poéticos.
Confira uma adaptação musical na voz de Cátia de França:
Aproveite para explorar melhor a poesia de Ferreira Gullar.
9. A Girafa Vidente, de Leo Cunha
Com
aquele
pescoço
comprido
espicha
espicha
espicha
a bicha
até parecia
que via
o dia de amanhã
Leonardo Antunes Cunha (1966), mais conhecido como Leo Cunha, é um jornalista e escritor brasileiro que tem se dedicado principalmente a criar obras para o público infantil.
Em A Girafa Vidente, o poeta se foca numa particularidade bem notória do animal: a sua altura. Como se assumisse o ponto de vista de uma criança, observa o longo pescoço da girafa, que parece quase não ter fim.
Por ser tão alta, o sujeito poético sugere que ela conseguiria ver além, podendo até prever o futuro. Também é engraçado reparar que a própria estrutura da composição (uma torre estreita e vertical) parece replicar o formato do animal.
10. Espantalho, de Almir Correia
Homem de palha
coração de capim
vai embora
aos pouquinhos
no bico dos passarinhos
e fim.
Almir Correia é um autor brasileiro de literatura infantojuvenil que também trabalha com animação. Talvez por isso, o poema Espantalho seja uma composição muito assente em aspectos visuais. Formado por apenas seis versos, o poema pinta uma imagem bastante nítida de um espantalho se desintegrando com o tempo.
Nada disso é descrito de forma triste ou trágica, pois tudo faz parte da vida. O espantalho, cujo propósito é assustar os pássaros, acaba sendo devorado pelos seus bicos.
11. A porta, de Vinicius de Moraes
Eu sou feita de madeira
Madeira, matéria morta
Mas não há coisa no mundo
Mais viva do que uma porta.
Eu abro devagarinho
Pra passar o menininho
Eu abro bem com cuidado
Pra passar o namorado
Eu abro bem prazenteira
Pra passar a cozinheira
Eu abro de supetão
Pra passar o capitão
Conhecido como "poetinha", Vinicius tinha o dom de conferir uma certa magia a acontecimentos e objetos aparentemente banais. Neste poema, o sujeito poético mostra toda a história que pode estar contida em uma simples porta.
Deste modo, fica claro que cada elemento do cotidiano faz parte da nossa vida e, se falasse, teria muito para contar sobre nós e aqueles que nos rodeiam. Aqui, existe uma personificação da porta, que escolhe se abrir de formas diferentes para cada personagem que aparece.
Escute, abaixo, a versão musicada, na voz de Fábio Jr.:
12. Amarelinha, de Maria da Graça Rios
Maré mar
é maré
mare linha
sete casas a pincel.
Pulo paro
e lá vou
num pulinho
segurar mais um ponto
no céu.
Maria da Graça Rios é uma escritora e acadêmica brasileira, autora de várias obras infantis como Chuva choveu e Abel e a fera. Em Amarelinha, o sujeito poético cria vários jogos de palavras a partir do nome da brincadeira famosa.
Na composição, o eu-lírico parece ser uma criança que está brincando de amarelinha e vai descrevendo os seus movimentos, até o final do jogo.
13. A Boneca, de Olavo Bilac
Deixando a bola e a peteca,
Com que inda há pouco brincavam,
Por causa de uma boneca,
Duas meninas brigavam.
Dizia a primeira: "É minha!"
— "É minha!" a outra gritava;
E nenhuma se continha,
Nem a boneca largava.
Quem mais sofria (coitada!)
Era a boneca. Já tinha
Toda a roupa estraçalhada,
E amarrotada a carinha.
Tanto puxaram por ela,
Que a pobre rasgou-se ao meio,
Perdendo a estopa amarela
Que lhe formava o recheio.
E, ao fim de tanta fadiga,
Voltando à bola e à peteca,
Ambas, por causa da briga,
Ficaram sem a boneca...
Olavo Bilac (1865 - 1918) foi um célebre poeta do parnasianismo brasileiro que também escreveu composições destinadas às crianças. Em A Boneca, o sujeito conta a história de duas garotas que começaram a brigar porque queriam brincar com a mesma boneca.
Em vez de partilharem e continuarem a brincadeira, cada uma queria a boneca para si. De tanto puxarem, acabaram destruindo a pobre boneca e, no final, ninguém brincou com ela. O poema vem lembrar as crianças que é fundamental aprendermos a partilhar e que a ganância apenas conduz a resultados ruins.
Conheça uma leitura e animação criada a partir do poema:
14. O Pinguim, de Vinicius de Moraes
Bom dia, Pinguim
Onde vai assim
Com ar apressado?
Eu não sou malvado
Não fique assustado
Com medo de mim.
Eu só gostaria
De dar um tapinha
No seu chapéu de jaca
Ou bem de levinho
Puxar o rabinho
Da sua casaca.
Neste poema cheio de bom humor, Vinícius brinca com a aparência dos pinguins. Por serem pretos e brancos, parecem estar vestidos de um jeito formal, usando uma casaca.
Assim, o sujeito lírico parece ser um garoto que vê o bichinho ao longe e quer se aproximar dele e tocá-lo, tentando não o assustar.
Não perca a versão do poema musicada por Toquinho:
15. Receita de espantar a tristeza, de Roseana Murray
Faça uma careta
e mande a tristeza
pra longe pro outro lado
do mar ou da lua
vá para o meio da rua
e plante bananeira
faça alguma besteira
depois estique os braços
apanhe a primeira estrela
e procure o melhor amigo
para um longo e apertado abraço.
Roseana Murray (1950) é uma escritora carioca, autora de obras de poesia e livros direcionados para o público infantil. A escritora publicou o seu primeiro livro, Fardo de Carinho, em 1980.
Em receita para espantar a tristeza, a poeta transmite uma mensagem muito especial de ânimo. Quando estamos tristes, o melhor que podemos fazer é interromper esse processo de sofrimento e procurar alguma coisa que nos faça rir (por exemplo, plantar bananeira).
Algo que também não pode faltar é a amizade: a simples presença de um amigo pode ser o suficiente para mandar a tristeza embora.
Fonte: Blog Cultura Genial
Carolina Marcello
Mestre em Estudos Literários, Culturais e Interartes e licenciada em Estudos Portugueses e Lusófonos pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto.
Nenhum comentário:
Postar um comentário