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domingo, 10 de novembro de 2019

Sobre interpretação textual


Observe a imagem com atenção. Antes de comentar, pergunto (preservando a personificação da imagem):


• As pinturas retratam a realidade de modo fiel?
• Aparentemente, houve a intenção de reproduzir a realidade?
• Se outros seres fizessem o mesmo registro, o resultado seria o mesmo?
• Sem discutir a ilustração com seres diferentes, o/a personagem seria capaz de perceber que seus registros não correspondem com exatidão à realidade?

Vocês já sabem onde quero chegar. Quando falamos sobre interpretação de texto, muitas pessoas (leigas, em geral) acreditam que todas as "leituras" devem ser respeitadas. Podemos entender por que alguém leu como leu, de modo respeitoso, mas existem leituras possíveis e leituras erradas. O chifre do rinoceronte NÃO faz parte da paisagem, mas somente confrontando a própria visão às de outros seres seria possível que o artista colocasse em xeque a própria interpretação.

O mesmo acontece quando lemos. A esse respeito, Marcuschi (1984) diz:

"[...] o contexto sociocultural, os conhecimentos de mundo, as experiências e as crenças individuais influenciam na organização das inferências durante a leitura. Como lembra Spiro (1980), [...] os conhecimentos individuais afetam decisivamente a compreensão, de modo que O SENTIDO NÃO RESIDE NO TEXTO. Assim, embora o texto permaneça como o ponto de partida para a sua compreensão, ele só se tornará uma unidade de sentido na interação com o leitor. [...] Os conhecimentos individuais pré-existentes, sejam quais forem, ativam durante a leitura determinados modelos ou cenários que determinam, nos indivíduos, compreensões diferentes para o mesmo texto."

Será que somos bons leitores, principalmente na internet? Deixamos nossas convicções atrapalharem os processos de inferência? Buscamos reler os textos, discuti-los ou ter acesso ao modo como outras pessoas o compreenderam? Colocamos à prova as "primeiras impressões" ao interpretar um texto ou o mundo? Termino com um trecho de uma entrevista publicada em 1982, de Freire: "eu acho que um dos princípios fundamentais para ler é aceitar que não se entendeu o que se leu.".

Fonte: BARZOTTO, VH. Estado de leitura. Campinas, SP: Mercado de Letras, 1999.

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