Meus pais não são velhos.
Quer dizer, velho é um conceito relativo.
Aos olhos da minha avó, são muito moços.
Aos olhos dos amigos deles, são normais.
Aos olhos das minhas sobrinhas, são muito velhos.
Aos meus olhos, estão envelhecendo.
Não sei se lentamente, se rápido demais ou se no tempo certo.
Mas sempre me causando alguma estranheza.
Lembro-me de quando minha mãe completou 60 anos. Aquele número me assustou.
Os 59 não pareciam muito, mas os 60 pareciam um rolo compressor que se
aproximava.
Daqui uns anos ela fará seus 70 e eu espero não tomar um susto tão
grande dessa vez.
Afinal, são apenas números.
Parece-me que a maior dificuldade é aprendermos a conciliar nosso
espírito de filho adulto com o progressivo envelhecimento deles.
Estávamos habituados à falsa ideia que reina no peito de toda criança de
que eles eram invencíveis.
As gripes deles não eram nada, as dores deles não eram nada.
As nossas é que eram graves, importantes e urgentes.
E de repente o quadro se inverte.
Começamos a nos preocupar – frequentemente de forma exagerada – com tudo
o que diz respeito a eles.
A simples tosse deles já nos parece um estranho sintoma de uma doença
grave e não uma mera reação à poeira.
Alguns passos mais lentos dados por eles já não nos parecem calma, mas
sim uma incômoda limitação física.
Uma conta não paga no dia do vencimento nos parece fruto de esquecimento
e desorganização e não um simples atraso como tantos dos nossos.
Num dado momento, já não sabemos se são eles que estão de fato vivendo
as sequelas da velhice que se aproxima ou se somos nós que estamos
excessivamente tensos, por começarmos a sentir o indescritível medo da hipótese
de perdê-los- mesmo que isso ainda possa levar 30 anos.
Frequentemente nos irritamos com nossos pais, como se eles não
estivessem tendo o comportamento adequado ou como se não se esforçassem o
bastante para manterem-se jovens, vigorosos e ativos, como gostaríamos que eles
fossem eternos.
De vez em quando esbravejamos e damos broncas neles como se estivéssemos
dentro de um espelho invertido da nossa infância.
Na verdade, imagino eu, nossa fúria não é contra eles. É contra o tempo.
O mesmo tempo que cura, ensina e resolve é o tempo que avança como ameaça
implacável. A nossa vontade é gritar “Chega,
tempo! Já basta! 60 já está bom! 65 no máximo! 70, não mais do que isso! Não
avance, não avance mais!”. E, erroneamente, canalizamos nos nossos pais
esse inconformismo.
O fato é que às vezes a lentidão, o esquecimento e as limitações são, de
fato, frutos da idade. Outras vezes são apenas frutos da rotina, tão naturais
quanto os nossos equívocos. Seja qual for a circunstância, eles nunca merecem
ter que lidar com a nossa angústia. Eles já lidaram com os nossos medos todos –
de monstros, de palhaços, de abelhas, de escuro, de provas de matemática – ao
longo da vida. Eles nos treinaram, nos fortaleceram, nos tornaram adultos. E
não é justo que logo agora eles tenham que lidar com as nossas frustrações.
Eles merecem que sejamos mais generosos agora.
Mais paciência e menos irritação. Menos preocupação e mais apoio. Mais
companheirismo e menos acusações. Menos neurose e mais realismo. Mais afeto e
menos cobranças. Eles só estão envelhecendo. E sabe do que mais? Nós também. E
é melhor fazermos isso juntos, da melhor forma.
Ruth
Manus
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