‘Tarde te amei!’ de Santo Agostinho, uma das mais belas orações
de todos os tempos
“Et ecce intus eras et ego foris et ibi te quaerebam, et in ista formosa
quae fecisti deformis irruebam…”
1. Tarde Te amei, ó
Beleza tão antiga e tão nova… Tarde Te amei! Trinta anos estive longe de Deus.
Mas, durante esse tempo, algo se movia dentro do meu coração… Eu era inquieto,
alguém que buscava a felicidade, buscava algo que não achava… Mas Tu Te compadeceste
de mim e tudo mudou, porque Tu me deixaste conhecer-Te. Entrei no meu íntimo
sob a Tua Guia e consegui, porque Tu Te fizeste meu auxílio.
2. Tu estavas dentro
de mim e eu fora… “Os homens saem para
fazer passeios, a fim de admirar o alto dos montes, o ruído incessante dos
mares, o belo e ininterrupto curso dos rios, os majestosos movimentos dos
astros. E, no entanto, passam ao largo de si mesmos. Não se arriscam na
aventura de um passeio interior”. Durante os anos de minha juventude, pus
meu coração em coisas exteriores que só faziam me afastar cada vez mais
d’Aquele a Quem meu coração, sem saber, desejava… Eis que estavas dentro e eu
fora! Seguravam-me longe de Ti as coisas que não existiriam senão em Ti.
Estavas comigo e não eu Contigo…
3. Mas Tu me
chamaste, clamaste por mim e Teu grito rompeu a minha surdez… “Fizeste-me entrar em mim mesmo… Para não
olhar para dentro de mim, eu tinha me escondido. Mas Tu me arrancaste do meu
esconderijo e me puseste diante de mim mesmo, a fim de que eu enxergasse o
indigno que era, o quão deformado, manchado e sujo eu estava”. Em meio à
luta, recorri a meu grande amigo Alípio e lhe disse: “Os ignorantes nos arrebatam o céu e nós, com toda a nossa ciência, nos
debatemos em nossa carne”. Assim me encontrava, chorando desconsolado,
enquanto perguntava a mim mesmo quando deixaria de dizer “Amanhã, amanhã”… Foi então que escutei uma voz que vinha da casa
vizinha… Uma voz que dizia: “Pega e lê.
Pega e lê!”.
4. Brilhaste,
resplandeceste sobre mim e afugentaste a minha cegueira. Então corri à Bíblia,
abri-a e li o primeiro capítulo sobre o qual caiu o meu olhar. Pertencia à
carta de São Paulo aos Romanos e dizia assim: “Não em orgias e bebedeiras, nem na devassidão e libertinagem, nem nas
rixas e ciúmes. Mas revesti-vos do Senhor Jesus Cristo” (Rm 13,13s).
Aquelas Palavras ressoaram dentro de mim. Pareciam escritas por uma pessoa que
me conhecia, que sabia da minha vida.
5. Exalaste Teu
Perfume e respirei. Agora suspiro por Ti, anseio por Ti! Deus… de Quem
separar-se é morrer, de Quem aproximar-se é ressuscitar, com Quem habitar é
viver. Deus… de Quem fugir é cair, a Quem voltar é levantar-se, em Quem
apoiar-se é estar seguro. Deus… a Quem esquecer é perecer, a Quem buscar é
renascer, a Quem conhecer é possuir. Foi assim que descobri a Deus e me dei
conta de que, no fundo, era a Ele, mesmo sem saber, a Quem buscava ardentemente
o meu coração.
6. Provei-Te, e,
agora, tenho fome e sede de Ti. Tocaste-me, e agora ardo por Tua Paz. “Deus começa a habitar em ti quando tu
começas a amá-Lo”. Vi dentro de mim a Luz Imutável, Forte e Brilhante! Quem
conhece a Verdade conhece esta Luz. Ó Eterna Verdade! Verdadeira Caridade! Tu
és o meu Deus! Por Ti suspiro dia e noite desde que Te conheci. E mostraste-me
então Quem eras. E irradiaste sobre mim a Tua Força dando-me o Teu Amor!
7. E agora, Senhor,
só amo a Ti! Só sigo a Ti! Só busco a Ti! Só ardo por Ti!…
8. Tarde te amei!
Tarde Te amei, ó Beleza tão antiga e tão nova! Tarde demais eu Te amei! Eis que
estavas dentro, e eu, fora – e fora Te buscava, e me lançava, disforme e nada
belo, perante a beleza de tudo e de todos que criaste. Estavas comigo, e eu não
estava Contigo… Seguravam-me longe de Ti as coisas que não existiriam senão em
Ti. Chamaste, clamaste por mim e rompeste a minha surdez. Brilhaste,
resplandeceste, e a Tua Luz afugentou minha cegueira. Exalaste o Teu Perfume e,
respirando-o, suspirei por Ti, Te desejei. Eu Te provei, Te saboreei e, agora,
tenho fome e sede de Ti. Tocaste-me e agora ardo em desejos por Tua Paz!
Santo Agostinho, Confissões
10, 27-29.
Fonte:
Aleteia
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