*Priscila Cruz
A crise de aprendizagem na
Educação Básica é a pior de nossas múltiplas crises. É uma crise silenciosa mas
que tem limitado o crescimento do País e contribuído enormemente para a
desigualdade na distribuição de renda e no acesso a oportunidades. Os países
que hoje têm os melhores indicadores econômicos e sociais devem muito de seu
sucesso a governantes com visão de longo prazo que fizeram da educação básica a
prioridade de seus governos.
Essa crise não é a mesma em
todo o Brasil. No Ensino Médio, por exemplo, apesar das médias nacionais serem
ainda muito baixas – apenas 7% dos jovens chegam ao final dessa etapa sabendo
calcular uma equação matemática simples – há redes de ensino com fortes avanços
em meio a outras em franco retrocesso. Para cada Ceará que avança, temos um Rio
de Janeiro que despenca. Os ótimos resultados de Goiás, Espírito Santo e
Pernambuco são anulados, na média nacional, pelas oscilações que mantém estados
como Amapá, Bahia e Pará em baixíssimos patamares.
Para expandirmos as
experiências de êxito para o País todo, há de se reconhecer algumas premissas.
Primeiro, agir para reduzir a desigualdade educacional não é promover o
coitadismo. Direcionar mais apoio e recursos financeiros para as populações em
desvantagem é um imperativo programático e ético. É pré-condição para uma
sociedade que caminha junta, uns apoiando os demais. Nunca é demais sublinhar
que igualdade no acesso às oportunidades é pré-condição de um sistema
verdadeiramente liberal e meritocrático.
Segundo, devemos nos livrar
das ideologias e das soluções mágicas. Não é promovendo a pauta ideológica do
Escola Sem Partido ou a pouco eficiente escola militar que vamos resolver o
problema da educação no Brasil.
A verdadeira solução, já
testada nas nossas experiências de êxito e nos países com melhor educação do
que a nossa, passa por outros caminhos: atendimento à primeira infância com a
articulação de educação, saúde, assistência, cultura e esporte; políticas
docentes de atração, formação inicial e continuada, carreira e condições de trabalho;
aprimoramento da governança do sistema federativo e da gestão das redes e
escolas; sistema de financiamento da educação pública mais redistributivo e com
indução para boas práticas de gestão; novo ensino médio com variedade de
itinerários formativos, incluindo a expansão da educação profissional e da
educação integral em tempo integral; política articulada com estados e
municípios para universalizar a alfabetização até o 2o ano do Ensino
Fundamental; implementação da Base Nacional Curricular Comum em todas as
escolas e salas de aula.
Os Estados e Municípios que
levam a sério a gestão educacional estão focados nas sete medidas acima. Nenhum
deles expurgando as teses de Paulo Freire ou perseguindo professores. Ao
contrário, as experiências de sucesso mostram que professores e alunos precisam
ser aliados e, portanto, promovem seu engajamento na condução das políticas
públicas educacionais. Essa é a lição do Espírito Santo, um dos estados com
maior avanço no Ideb – Índice de Desenvolvimento da Educação Básica – do País.
Lá os gestores educacionais souberam aliar a implementação das políticas com
forte envolvimento dos próprios estudantes, professores e famílias. A condução
importa e faz muita diferença.
Melhor gestão educacional
significa atuar em 3 frentes: melhor alocação dos recursos, melhor
implementação das políticas e combate aos desperdícios e desvios. As escolas
militares são um bom exemplo de alocação ineficiente. Elas até são demanda de
uma parte da população e podem parecer um bom modelo de escola, mas não passam
no teste. Conforme matéria da jornalista Renata Cafardo publicada por este
jornal, o investimento por aluno é três vezes maior do que na escola regular de
turno parcial, faz seleção de alunos e atende uma parcela com nível
socioeconômico mais alto. Por outro lado, temos a experiência das escolas de
educação integral em tempo integral cujo modelo começou em Pernambuco e já está
em 17 Estados. Nesse modelo, não há seleção de alunos, eles ficam na escola de
7 a 9 horas por dia, o custo por aluno é 30% maior do que na escola regular de
4 horas diárias e são as escolas com os melhores resultados no Ensino Médio
brasileiro.
Outro exemplo de melhor
alocação é a priorização da Educação Básica no orçamento federal. É preciso ter
a coragem para abrir a discussão sobre cobrança de mensalidade e serviços no
Ensino Superior público para que mais recursos possam ser direcionados à
Educação Básica, em especial para as escolas que atendem a população mais
pobre. A lógica deveria ser: quem pode pagar ajuda a formação básica dos que
mais precisam.
Por fim, quando falamos em
aprendizagem, não estamos só falando em Língua Portuguesa, Ciências e
Matemática. Ao lado de universalizar a aprendizagem nesses campos do
conhecimento, também faz parte da formação escolar o preparo para a vida, a
cidadania e o mundo do trabalho e a consolidação de competências essenciais em
um ambiente cada vez mais diverso, complexo e desafiador que essas crianças e
jovens já vivem. Assegurar um ambiente escolar acolhedor, respeitoso com as
múltiplas diversidades e que seja de confiança para que cada aluno, professor e
profissional da Educação se sinta protegido para expressar suas opiniões,
projetos de vida, aspirações, ideias e ideais, é aspecto fundamental para a
formação para o século 21, para a convivência democrática e para uma vida
produtiva.
A responsabilidade do
presidente da república na condução das políticas educacionais é imensa. É
preciso escolher as boas batalhas, e não as soluções mágicas ou simplistas. É o
que o Brasil quer e mais precisa.
* Co-fundadora e Presidente-Executiva
do Todos Pela Educação
Nenhum comentário:
Postar um comentário