Ferreira Gullar, ou melhor, José Ribamar Ferreira, nasceu no Maranhão,
em 1930. Neste dia 10 de setembro, completaria 88 anos. Porém, em 2016, o
grande poeta faleceu, vítima de uma pneumonia.
Para relembrarmos Ferreira Gullar, compartilhamos uma entrevista até
então inédita no Fronteiras.com, concedida à Braskem quando participou do
Fronteiras do Pensamento, em 2015.
Gullar foi o quarto de 11 filhos e se tornou um dos maiores pensadores
do Brasil. Foi crítico de arte, biógrafo, tradutor, memorialista e ensaísta,
mas gostava mesmo era de poesia.
Do Neoconcretismo à política, passando pelas artes diversas, Gullar fez
de tudo: foi locutor, trabalhou em jornais, revistas, fez parte da equipe que reformulou
o jornal do Brasil, fez roteiros para TV e gravou discos.
Autor de mais de 30 livros de poesias, ensaios e crônicas, o maranhense
começou cedo como poeta e jornalista. Com o lançamento de A luta corporal, em
1954, provocou grande impacto, inovando e desarticulando a linguagem poética e
se integrando à vanguarda concretista, ao lado dos poetas Augusto de Campos
(1931), Haroldo de Campos (1929-2003) e Décio Pignatari (1927-2012). Rompeu com
o movimento em 1957 por considerá-lo excessivamente racional. Gullar defendia
mais subjetividade, o que resultou na fundação do movimento Neoconcreto.
No dia seguinte ao Golpe Militar de 1964, Gullar se filiou ao Partido
Comunista Brasileiro e desenvolveu intensa atividade no teatro como um dos
fundadores do Grupo Opinião, que combateu a ditadura com formas inovadoras de
teatro e de shows. Exilado político na Argentina, Gullar lançou o seu Poema
Sujo em 1976, que se tornou um marco da poesia brasileira.
Seu próximo trabalho foi lançado quatro anos depois. É a obra Na
vertigem do dia, que marca o retorno de Gullar às terras brasileiras, depois do
período em que esteve no exílio. Neste livro, a poesia surge entre o gesto
revolucionário e o lirismo pessoal. Poemas famosos dele, como Morte de Clarice
Lispector e Traduzir-se estão nesta obra.
“Se não houver espanto, não há poesia”
Em 2010, Gullar foi agraciado com o Prêmio Camões, o mais importante
prêmio literário da Comunidade de Países de Língua Portuguesa, pelo conjunto da
obra. Aos 84 anos, foi eleito imortal da Academia Brasileira de Letras, titular
da cadeira 37, antes ocupada pelo poeta e tradutor Ivan Junqueira. Aos 86 anos,
faleceu, deixando saudades aos leitores de suas crônicas e poesias.
Ferreira Gullar representou o melhor da Inteligência brasileira com seu
talento, independência e a força do seu pensamento. Em sua conferência no
Fronteiras, em 2015, falou sobre a importância e os limites da poesia, sobre a
sociedade contemporânea e sobre o tema do projeto daquele ano, Como viver
juntos:
“Os homens, embora sejam
iguais em direito, não o são em qualidades. A natureza é injusta. A justiça é
uma invenção humana. Nós a inventamos porque não aguentamos a desigualdade. Se
a sociedade não pode ser completamente justa, pode ser menos desigual. A solução
para vivermos juntos é sermos tolerante a opiniões diferentes das nossas.”
Nesta breve entrevista à Braskem, patrocinadora do nosso site e dos
nossos canais digitais, Gullar esbanja sua tradicional espontaneidade e
irreverência, nos lembrando do porquê de tanta saudade deste grande poeta. Leia
e assista abaixo à entrevista.
Como nasce a sua poesia?
Ferreira Gullar: Eu costumo dizer
que a poesia nasce do espanto, de alguma coisa que te surpreende, que se revela
inesperada, misteriosa ou bela ou enfim. Eu não escrevo poesia, nem ninguém
escreve, como eu escrevo, por exemplo, as crônicas para o jornal.
É outro estado. É outra coisa. A crônica eu decido o que eu vou
escrever. Vou escrever agora. Poesia não se faz assim. Não é você que decide.
Uma de suas frases mais
famosas é “não quero ter razão, quero ser feliz”. Qual conselho você daria para
quem pretende seguir isso?
Ferreira Gullar: O que eu digo é
que é melhor ser feliz do que ter razão. É isso que eu quero dizer. Às vezes,
as pessoas entram em conflito com as outras porque querem ter razão. Para quê?
Para fazer o que com isso? Nada. Aliás, a palestra que eu darei termina com
esta frase, compreende? Porque as pessoas… Os palestinos estão brigando com os
israelenses há 70 anos. Para com isso, cara. Senta na mesa, façam as pazes,
parem de se matar. É uma maluquice. Para de ter razão, cara.
Matéria
originalmente publicada no site Fronteira do Pensamento
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