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segunda-feira, 19 de novembro de 2018

Amor, Ordem e Progresso



As duas palavras de nossa bandeira, “ordem” e “progresso”, são de inspiração positivista. Mas, à semelhança do lema dos inconfidentes, ainda presente nas bandeiras de Minas Gerais e do Acre, não são uma citação fiel ao original.
Com efeito, Augusto Comte resumiu sua doutrina de modo diferente na primeira edição de seu Catecismo positivista: “O Amor por princípio, a Ordem por base e o Progresso por fim”. As três palavras, fundamentos de seu sistema filosófico, foram escritas com iniciais maiúsculas.
Mais tarde, o autor deu nova redação ao lema, que ficou assim: “O Amor por princípio, e a Ordem por base; o Progresso por fim”.
Criador de novos vocábulos - foi ele quem inventou a palavra “sociologia” -, justificou “a feliz modificação, que esta manhã introduzi, a tempo, sem dúvida, na fórmula fundamental da nossa religião”, escrevendo: “Combino o segundo termo com o primeiro; isolando o último; o que doravante deve adaptá-la melhor ao seu destino normal”.
Acrescentou ainda outros motivos: “Enquanto eu tive de superar a insurreição do espírito contra o coração e a cisão do progresso relativamente à ordem, a forma primitiva era preferível. Mas, tendo o meu volume final preenchido assaz essas duas condições, a nova redação fará sentir melhor a constituição religiosa do positivismo, a aliança entre o amor e a fé para guiar a atividade”.
A República nasceu em berço violento. Seus obstetras estavam armados quando trouxeram a criança ao Brasil, no dia 15 de novembro de 1889. Os positivistas derrubaram, por golpe militar, um imperador que estava no poder desde o dia 7 de abril de 1831. Dom Pedro II tinha apenas 6 anos quando sucedeu ao pai, Dom Pedro I. Estava no poder há 58 anos, nove dos quais sob tutela de José Bonifácio de Andrada e Silva e de Manuel Inácio de Andrade Souto Maior, o Marquês de Itanhaém.
O pai abdicou em favor do filho para enfrentar o irmão, Dom Miguel, a quem derrotou em campos de batalha. O tio usurpara da sobrinha, Dona Maria II, nada mais nada menos que o trono português. Dom Pedro I fez por merecer, além de todos os títulos, o de pai herói, pai do século. Deu um país para cada filho! E fez tudo isso em pouco tempo. Ao morrer, em 1834, tinha apenas 36 anos.
Mas quais eram as armas do imperador? Duas lhe foram essenciais e ele soube manejá-las com coragem. A palavra e a espada. Os monumentos não soluçam, mas Dom Pedro I, bem representado, a cavalo, de espada na mão, frequentemente é ofendido por palavras, atos e omissões, assim como outros heróis que tanto fizeram pelo Brasil.
Semana passada foi o próprio presidente Lula o autor de estranha lamentação: a falta de heróis brasileiros! Quanta desinformação do presidente, quanta falta de escola e quanta indulgência da imprensa diante de ofensa assim descomunal!
Dom Pedro I foi o nosso Bolívar. Utilizou a espada para garantir a liberdade e a independência. Teve os seus feitos heroicos facilitados por outro estadista que o Brasil insiste em desprezar. É Sebastião José de Carvalho, o Marquês de Pombal, de quem os ímpios gostam de lembrar apenas que expulsou do Brasil os padres jesuítas. Como se não tivesse reconstruído Lisboa após o terremoto, nem incrementado a lavoura de café e a construção naval entre nós. E, principalmente, como se não tivesse incentivado o ensino da língua portuguesa no Brasil.
Esta coluna alterna assuntos miúdos do português cotidiano com algumas visões panorâmicas. Hoje lembramos que a omissão do amor no lema inscrito na Bandeira Nacional é sintoma de desordem e atraso. Quem leu Os sertões, de Euclides da Cunha, sabe que os republicanos não o excluíram apenas da bandeira. A violência segue vitoriosa. Em Canudos alcançou seu apogeu.

[Coluna Língua Viva - JB - 08/09/2004 - E-Mail: teresa97@terra.com.br]

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